quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

As intermitências da Vista (... e da Vida...)

É com inusitada frequência que descuramos a capacidade de adaptação às circunstâncias que nos "equipa de série", à cegueira que nos assola sem nos atraiçoar por um momento que seja com a perda do sentido visual com que o extraordinário processo de evolução da espécie nos dotou. Retira-nos Visão sem em momento algum nos privar da capacidade de ver...

Deste aparente paradoxo resulta uma quase tão óbvia evidência: é tão fácil cegar num mundo em que só vemos o que queremos e em função do que cremos!... Perdemos demasiado tempo limitados pelo nosso campo visual, tão restrito quanto o que conhecemos da nossa própria essência. Perdemos ainda mais tempo a fundamentar o que vemos, quando de tudo o que precisávamos era fechar os olhos, deixar de ver por uns instantes, e ir um pouco mais além. Valorizar o que realmente interessa, o que de facto nos proporciona momentos de rara felicidade, que nos inundam de energia para enfrentar o futuro...

Que me perdoem a frieza ou o despropósito das minhas palavras. Mas não deixo de partilhar o que penso (na medida tão ténue do que é partilhável...). E que mais não é do que a crença de que a grande diferença entre ser cego e ser invisual está na excepcional capacidade dos que são assolados por esta última condição se adaptarem às adversidades, e tudo porque delas estão conscientes...

O ideal está longe do óptimo. Que por sua vez está a anos luz do medíocre. É um facto. Faz o que digo, não faças o que faço. Cego não é quem não vê. É quem por perder demasiado tempo a olhar para o acessório, vive uma intermitência da Vida, de que apenas anseia sair no dia em que se consciencializa da cegueira que o assola, porque até lá acreditou tão somente no que (não) queria ver... Perdemos demasiado tempo da Vida afectados por esta cegueira metafórica, inebriante, sórdida, a roçar por vezes um estado de espírito colectivo de manifesta conformação.

Tudo isto para partilhar que a evolução do blogue não foi excepção à condição do seu autor, a esta intermitência da Vida que tem tanto de má quanto de necessária, porque o que não nos extingue faz-nos mais fortes...

E assim anseio, sôfrego, por vezes ofegante, regressar ao que de facto valorizo, às linhas da escrita que tanto alento me dá, assim como corpo e estrutura aos pensamentos que vagueiam desordenados até ao momento em que preenchem mais uma página da Vida...

N.A.: O título peca pela falta de originalidade. Devo a sua adaptação à imaginação infindável de um grande Autor, José Saramago (escreveu As Intermitências da Morte). O conceito, esse, devo-o em parte à inspiração do Ensaio sobre a Cegueira, transposto brilhantemente para o grande ecrã num filme que recomendo vivamente, para (ironicamente) observar de olhos bem abertos...

Aos descrentes na escrita de Saramago, leiam com olhos de ver e perdoem o quanto custa pelo bem que nos faz...

2 comentários:

Marlene G. disse...

my friend demorou mas valeu a pena!
o que adoro naquilo que tu escreves é perder-me a tentar imaginar o que levou a isso...
Muitas vezes criam-se palas invisivieis que não nos permite alargar as vistas! É uma pena é verdade, porque há coisas que valem muito mais que auilo que está a nossa frente!

Anónimo disse...

Carissimo,

Valeu a pena, o simples sentido da visao permite ler estas palavras, mas algo mais serviu para prender a atenção.

Promessa de futuras vindas a este espaço

Abraço

Joao Machado